No dia que entraste naquele avião, eu senti-me
morrer. Morrer de saudades, mesmo antes de ver o avião a descolar do chão, o
mesmo chão que eu pisava, onde eu sabia que em poucos minutos deixarias de
estar também. Mas eu acreditava que voltavas. Eu sabia que voltarias. Esperei
por ti, todos os minutos, todos os segundos, eu esperei por ti, escrevi-te
todos os dias, tu escreveste-me todos os dias, durante meses, durante um ano,
cartas cheias de páginas, tu escrevias na minha língua, eu escrevia na tua, e, de
um momento para o outro, o nosso mundo desabou… Proibiram-me de te amar, deixei
de receber cartas tuas, perdi-te a milhares de quilómetros. A vida colapsou
entre nós e nem sequer pudemos dar um abraço, um último beijo, nem sequer pudemos
olhar nos olhos um do outro e falar… porque havia um oceano entre nós…
Acreditei tantos anos que tu voltarias um dia, que
haverias de me querer outra vez, sonhei com isso, esperei, mas os anos passaram
e a vida, essa, não me deu folgas… A minha mãe adoeceu, o meu melhor amigo
morreu, tu casaste, tiveste um filho, eu chorei como se o chão tivesse aberto
um fosso nos meus pés, senti-me perdida, perdi toda a esperança, perdi-me… Tentei
não pensar mais nos meus sentimentos por ti, doía demais e, muitos anos depois,
casei também. No ano seguinte, escreveste-me a dizer que querias falar comigo,
e contaste-me que te tinhas divorciado, que sentias a minha falta, que não me
esqueceras, eu estava grávida do meu filho, senti-me dilacerada… Não te podia
dizer que ainda te amava, não podia, não sabia o que fazer e escondi-me, atrás
das próprias grades que eu criei, para proteger o meu filho do sofrimento, do
desgosto…
Ele nasceu, amei-o todos os segundos, sorri-lhe
todos os dias, no brilho dos olhos dele acreditei que fiz o que estava certo,
o que qualquer mãe faria…E enquanto o via a crescer, o meu coração desfazia-se
como grãos de areia com o tempo, sem ti…
Seis anos depois, escreveste-me a dizer que ias
voltar. Passados vinte e seis anos, irias atravessar o oceano entre nós… Mas
naquele instante enquanto a luz da esperança parecia brilhar como uma estrela,
também me disseste que ias casar… Pensei que não podia extinguir-me por dentro
outra vez, mas foi como se me tivessem dado um choque para me reanimar, só para
poder morrer outra vez…
Embora viesses sozinho para o meu País, o teu
coração tinha novamente dono e não era eu…
Tive medo de acreditar que voltarias mesmo, até
porque em algum dia eu deixei de acreditar que voltarias, não depois de tantos anos, não pensei que pudesse cair tal explosão tipo quasar na minha vida. Muito
menos agora com as nossas vidas alinhadas em quadrantes diferentes…
Quando me disseste o dia e a hora do avião, eu
acreditei. Acreditei que ias voltar. E, durante meses, rezei, eu que nunca fui
de rezar, rezei, pedi, implorei, para que nada te impedisse, para que nada
acomtecesse, para te poder voltar a ver, nem que fosse só mais uma vez. Contei cada
dia, cada hora, cada minuto, até hoje. Esta semana, mal dormi, mal comi, mal
consegui pensar, mal respirei…
Só quero ir a correr, abraçar-te, quero
agarrar-te e nunca mais te largar…
Agora, chegou finalmente a hora, eu estou aqui no
aeroporto, o teu avião já aterrou, e eu estou aqui sem conseguir tirar os olhos
da porta de chegadas, à espera de te ver, vinte e seis anos depois. Não consigo
inspirar, a cada minuto que passa eu fico com mais medo que não saias daquela
porta, porque não sei se entraste mesmo no avião, e, para mim, que esperei tantos anos, estes minutos deviam parecer curtos, mas, no entanto, parecem
um caminho tumultuoso sem fim…
(Continua...)
Sandra Reis